O esquema de venda de decisões judiciais – popularmente conhecido como venda de sentenças – identificado pela Polícia Federal (PF) no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) envolve um processo suspeito que impõe um prejuízo de R$ 178 milhões ao Banco do Brasil (BB), referente ao pagamento de honorários advocatícios aos filhos do desembargador Vladimir Abreu da Silva e ao advogado Felix Jaime Nunes da Cunha, apontado como lobista do esquema.
O valor, caso fosse um prêmio da Mega-Sena, seria o oitavo maior da história.
Uma execução de dívida referente a um financiamento agrícola que foi contraído por um casal de Três Lagoas na década de 1990 – dívida essa que nunca foi paga – prescreveu em 2018, por falta de bens penhoráveis.
No entanto, em 2019, ao chegar ao TJMS, a dívida se transformou em um passivo significativo para o banco: um honorário sucumbencial de R$ 178 milhões, valor a ser pago aos advogados da ação.
A PF constatou que esses honorários sucumbenciais resultaram de uma decisão controversa sobre se o pagamento é ou não cabível.
Em primeira instância, entendeu-se que nenhuma das partes precisaria arcar com honorários, pois o caso foi prescrito e não houve vencedor: o banco não conseguiu recuperar sua dívida e o casal não obteve uma decisão favorável.
Os advogados do casal devedor, contudo, recorreram ao TJMS reivindicando o direito aos honorários e, após se associarem aos envolvidos no esquema de venda de sentenças, o direito ao pagamento pelo Banco do Brasil foi então estabelecido.
HONORÁRIO “MEGA-SENA”
Esse poderia ser um caso comum nos tribunais, não fosse o envolvimento de Felix Jaime Nunes da Cunha, apontado como um dos lobistas do esquema de venda de sentenças desbaratado recentemente pela PF.
Ele firmou um contrato de parceria com os advogados originários da causa, Patrícia Alves Gaspareto de Souza Machado e Geilson da Silva Lima. O contrato contou com o anuente Marcus Vinícius Machado Abreu da Silva, filho do desembargador Vladimir Abreu da Silva.
No contrato, os advogados cedentes do crédito dos honorários, Patrícia e Geilson, cedem a Cunha o valor da execução que exceder os R$ 60 milhões, permitindo ainda que ele possa receber o crédito diretamente do BB.
O contrato de parceria foi formalizado em papel timbrado pelo escritório de Marcus Vinícius e Ana Carolina Abreu, filhos do desembargador que, desde o dia 24, está afastado de suas funções em função do envolvimento no esquema – Abreu deveria estar usando tornozeleira eletrônica, mas até ontem ela ainda não instalada.
Ao chegar ao TJMS, a apelação dos advogados foi julgada procedente. O Tribunal, sob relatoria de Divoncir Schreiner Maran, acolheu o pedido dos advogados – agora associados aos irmãos Abreu e a Cunha – e reverteu a decisão de primeira instância, obrigando o BB a pagar honorários de 10% a 20% sobre o benefício econômico obtido pelo devedor.
Assim, o Banco do Brasil – após ser lesado nos anos 1990 por um casal de Três Lagoas que não honrou o financiamento – viu a ação de cobrança, prescrita por falta de bens penhoráveis, se transformar em um passivo de R$ 178 milhões em honorários advocatícios.
Também houve decisões em segunda instância do desembargador Sideni Soncini Pimentel, presidente eleito do TJMS, também afastado do cargo durante a operação e que deveria estar usando tornozeleira eletrônica.
“O fato de Pimentel ter decidido em favor do cliente de Marcos Vinícius Abreu, o qual tem escritório no mesmo local que o filho de Pimentel, o advogado Rodrigo Pimentel, agrava os indícios de vendas de decisões com pagamento realizado por meio da cedência de parte do crédito”, argumenta a PF no relatório assinado pelo delegado Marcos Damato.
BANCO NÃO DESISTE
A batalha do BB para não ter que arcar com esse valor ainda se desenrola no TJMS. O banco tem perdido todas as disputas até o momento em Mato Grosso do Sul e deposita suas esperanças no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em março, o Banco do Brasil ingressou com uma ação rescisória contra o acórdão que o obrigou a pagar honorários milionários aos advogados de Três Lagoas, a Cunha e aos irmãos Abreu. No entanto, perdeu a primeira batalha, com julgamento unânime em que o relator, desembargador Amaury da Silva Kuklinski, foi acompanhado por Vilson Bertelli, Geraldo de Almeida Santiago e Eduardo Machado Rocha.
Insatisfeito, o BB apresentou embargos de declaração, recurso no qual solicita que os julgadores esclareçam melhor a decisão, especialmente em pontos que possam ter ficado obscuros. Porém, o pedido foi novamente rejeitado, com o desembargador Kuklinski negando o recurso em 19 de agosto.
Restou ao banco ingressar com um recurso especial, com a intenção de levar o caso ao STJ e contestar a decisão que lhe impôs o pagamento de R$ 178 milhões em honorários em uma ação sem vitória da outra parte.
O vice-presidente do TJMS, Dorival Renato Pavan, por sua vez, recusou o recurso no dia 18 de outubro, por entender que ele não atendia aos critérios de admissibilidade. Ainda assim, o banco deve prosseguir na disputa, buscando a análise do caso no STJ, por meio de um agravo especial.
Comparação entre honorário arbitrado pelo TJMS e prêmios históricos da Mega Sena:
Fonte: Correio do Estado
O esquema de venda de decisões judiciais – popularmente conhecido como venda de sentenças – identificado pela Polícia Federal (PF) no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) envolve um processo suspeito que impõe um prejuízo de R$ 178 milhões ao Banco do Brasil (BB), referente ao pagamento de honorários advocatícios aos filhos do desembargador Vladimir Abreu da Silva e ao advogado Felix Jaime Nunes da Cunha, apontado como lobista do esquema.
O valor, caso fosse um prêmio da Mega-Sena, seria o oitavo maior da história.
Uma execução de dívida referente a um financiamento agrícola que foi contraído por um casal de Três Lagoas na década de 1990 – dívida essa que nunca foi paga – prescreveu em 2018, por falta de bens penhoráveis.
No entanto, em 2019, ao chegar ao TJMS, a dívida se transformou em um passivo significativo para o banco: um honorário sucumbencial de R$ 178 milhões, valor a ser pago aos advogados da ação.
A PF constatou que esses honorários sucumbenciais resultaram de uma decisão controversa sobre se o pagamento é ou não cabível.
Em primeira instância, entendeu-se que nenhuma das partes precisaria arcar com honorários, pois o caso foi prescrito e não houve vencedor: o banco não conseguiu recuperar sua dívida e o casal não obteve uma decisão favorável.
Os advogados do casal devedor, contudo, recorreram ao TJMS reivindicando o direito aos honorários e, após se associarem aos envolvidos no esquema de venda de sentenças, o direito ao pagamento pelo Banco do Brasil foi então estabelecido.
HONORÁRIO “MEGA-SENA”
Esse poderia ser um caso comum nos tribunais, não fosse o envolvimento de Felix Jaime Nunes da Cunha, apontado como um dos lobistas do esquema de venda de sentenças desbaratado recentemente pela PF.
Ele firmou um contrato de parceria com os advogados originários da causa, Patrícia Alves Gaspareto de Souza Machado e Geilson da Silva Lima. O contrato contou com o anuente Marcus Vinícius Machado Abreu da Silva, filho do desembargador Vladimir Abreu da Silva.
No contrato, os advogados cedentes do crédito dos honorários, Patrícia e Geilson, cedem a Cunha o valor da execução que exceder os R$ 60 milhões, permitindo ainda que ele possa receber o crédito diretamente do BB.
O contrato de parceria foi formalizado em papel timbrado pelo escritório de Marcus Vinícius e Ana Carolina Abreu, filhos do desembargador que, desde o dia 24, está afastado de suas funções em função do envolvimento no esquema – Abreu deveria estar usando tornozeleira eletrônica, mas até ontem ela ainda não instalada.
Ao chegar ao TJMS, a apelação dos advogados foi julgada procedente. O Tribunal, sob relatoria de Divoncir Schreiner Maran, acolheu o pedido dos advogados – agora associados aos irmãos Abreu e a Cunha – e reverteu a decisão de primeira instância, obrigando o BB a pagar honorários de 10% a 20% sobre o benefício econômico obtido pelo devedor.
Assim, o Banco do Brasil – após ser lesado nos anos 1990 por um casal de Três Lagoas que não honrou o financiamento – viu a ação de cobrança, prescrita por falta de bens penhoráveis, se transformar em um passivo de R$ 178 milhões em honorários advocatícios.
Também houve decisões em segunda instância do desembargador Sideni Soncini Pimentel, presidente eleito do TJMS, também afastado do cargo durante a operação e que deveria estar usando tornozeleira eletrônica.
“O fato de Pimentel ter decidido em favor do cliente de Marcos Vinícius Abreu, o qual tem escritório no mesmo local que o filho de Pimentel, o advogado Rodrigo Pimentel, agrava os indícios de vendas de decisões com pagamento realizado por meio da cedência de parte do crédito”, argumenta a PF no relatório assinado pelo delegado Marcos Damato.
BANCO NÃO DESISTE
A batalha do BB para não ter que arcar com esse valor ainda se desenrola no TJMS. O banco tem perdido todas as disputas até o momento em Mato Grosso do Sul e deposita suas esperanças no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em março, o Banco do Brasil ingressou com uma ação rescisória contra o acórdão que o obrigou a pagar honorários milionários aos advogados de Três Lagoas, a Cunha e aos irmãos Abreu. No entanto, perdeu a primeira batalha, com julgamento unânime em que o relator, desembargador Amaury da Silva Kuklinski, foi acompanhado por Vilson Bertelli, Geraldo de Almeida Santiago e Eduardo Machado Rocha.
Insatisfeito, o BB apresentou embargos de declaração, recurso no qual solicita que os julgadores esclareçam melhor a decisão, especialmente em pontos que possam ter ficado obscuros. Porém, o pedido foi novamente rejeitado, com o desembargador Kuklinski negando o recurso em 19 de agosto.
Restou ao banco ingressar com um recurso especial, com a intenção de levar o caso ao STJ e contestar a decisão que lhe impôs o pagamento de R$ 178 milhões em honorários em uma ação sem vitória da outra parte.
O vice-presidente do TJMS, Dorival Renato Pavan, por sua vez, recusou o recurso no dia 18 de outubro, por entender que ele não atendia aos critérios de admissibilidade. Ainda assim, o banco deve prosseguir na disputa, buscando a análise do caso no STJ, por meio de um agravo especial.
Comparação entre honorário arbitrado pelo TJMS e prêmios históricos da Mega Sena: